Dia 2 (13
de Junho)
Os deuses da montanha acordaram mal dispostos neste Dia de Santo António
e brindaram os turistas com trovoada e alguma chuva, definindo, desde logo, quem
é que manda nestas paragens. Se dúvidas houvesse, ficou claro o porquê do fato
de chuva ser um equipamento (quase) indispensável na bagagem de qualquer motociclista
que se desloque aos Picos da Europa, independentemente da altura do ano.
Manhã chuvosa em Boca de
Huérgano.
Apesar da progressiva acalmia verificada com o decorrer da manhã, pelo
sim pelo não resolvi vestir as calças de chuva antes de rumar montanha acima. O
plano para este segundo dia era um tanto ou quanto ambicioso e passava por
visitar Caín de Valdeón (La Ruta del Cares), Desfiladeiro de Los Beyos, Cangas
de Onís, Covadonga (Santuário e Lagos) e, para terminar, a zona de Arenas de
Cabrales, efectuando assim a passagem da comunidade autónoma de Castela e Leão
para o Principado das Astúrias.
Da comunidade autónoma de
Castela e Leão ao Principado das Astúrias.
Com um céu bastante carregado, fiz-me então à estrada com redobrada
atenção em direcção a Portilla de la Reina (N-621) e daqui até Posada de
Veldeón (LE-2703), com uma breve paragem no Mirador
de Pandetrave para apreciar o imponente Maciço Central. É de realçar que,
tanto as estradas de curvas encadeadas com bom piso, como o deslumbrante cenário
verdejante em contraste com os rochosos e agrestes picos, são um verdadeiro
regalo para os amantes das duas rodas e da natureza.
O caminho para Caín de Valdeón faz-se por uma estrada estreita mas muito
bonita, sempre com o Rio Cares por perto, onde é necessário ter algum cuidado com
o trânsito em sentido contrário, em especial com as volumosas autocaravanas que
por aqui circulam. Sensivelmente a meio caminho, um pouco depois de Cordiñanes
de Valdeón, surge o Mirador
del Tombo, local ideal para desfrutar de uma vista excepcional do vale que
une Posada de Valdeón a Caín.
Mirador del Tombo, Cordiñanes
de Valdeón.
Uma das rotas pedestres mais conhecidas dos Picos da Europa é a Ruta del Cares (PR-PNPE-3). O percurso actual
tem início em Posada de Valdeón, passa por Caín de Valdeón e continua pelo
desfiladeiro do Rio Cares até Poncebos, num total de cerca de 21 km de
extensão. Mas é a partir de Caín que os últimos 12 km adquirem outra dimensão.
Também chamada de “Garganta Divina”, aqui a rota inclui a travessia de vários túneis
com grandes buracos em forma de janela e de algumas grutas escavadas na rocha
calcária dos maciços. A não perder!
La Ruta del Cares, Caín de
Valdeón.
Pequena represa no Rio
Cares, Caín de Valdeón.
De regresso à estrada e a Posada de Valdeón, a aventura continuou rumo
ao Desfiladeiro
de Los Beyos, primeiro pela estrada LE-2711 até entroncar com a espectacular
N-625. Curvas, túneis e paisagens de extraordinária beleza foram servidas em
doses generosas durante este trajecto até Cangas de Onís. Um verdadeiro paraíso
para qualquer motociclista!
Por cima das nuvens...
Desfiladeiro de Los Beyos.
Após a vitória sobre os muçulmanos na Batalha de Covadonga no ano de
722, Pelayo estabeleceu a sua corte em Cangas de Onís, que assim se tornou na
primeira capital do Reino das Astúrias. Em homenagem a este feito heroico, em
1939 foi colocada uma Cruz da Vitória, símbolo das Astúrias e parte integrante
do emblema heráldico do Principado, sob o arco central da Ponte
romana sobre o Rio Sela, um dos mais icónicos monumentos desta histórica cidade.
Ponte romana sobre o Rio
Sela, Cangas de Onís.
Outro monumento interessante, desta feita para os motociclistas, é o que
se encontra perto da Igreja de Nossa Senhora da Assunção de Santa Maria (43º21'03.7"N
5°07'39.9"W). Foi inaugurado em Setembro de 2016 e a sua inscrição é
verdadeiramente inspiradora: “AQUÍ
COMIENZA TODO UN PARAÍSO DE CURVAS”. Mais palavras para quê...
Monumento ao motociclista,
Cangas de Onís.
Em simultâneo, decorriam as comemorações do Dia de Santo António (Fiesta
de San Antonio de Padua), com uma procissão pelas ruas da cidade em elegantes
trajes tradicionais. E por falar em tradições, não há melhor forma de
acompanhar os vários pratos típicos da zona que uma garrafa da famosa Sidra das Astúrias. Bebe-se em pequenos
goles (“culinos”) escanceados em copos típicos, através de uma técnica muito
particular que requer uma notável habilidade e precisão. Só visto!
Mas chega de falar de gastronomia que ainda faltam algumas dezenas de
quilómetros para percorrer até ao final do dia. Com o estômago aconchegado, as
estradas AS-114 e AS-262 levavam-me até ao Santuário de Covadonga para uma
visita à Basílica
e à Santa
Cueva, actual local da imagem da Virgem de Covadonga e, segundo a tradição,
refúgio de Pelayo e seus homens durante a Batalha de Covadonga (é também aqui
que se encontra o seu túmulo).
Santuário de Covadonga,
Covadonga.
Continuando a subir pelas estradas do Maciço Ocidental dos Picos da
Europa (CO-4) em direcção aos famosos Lagos
de Covadonga, por entre inúmeros bovinos a pastar (alguns inclusive
deitados no meio da estrada...) e um nevoeiro que por vezes encurtava o
horizonte, lá cheguei ao Lago
Enol e ao Lago
de la Ercina para contemplar estas lagoas glaciares situadas entre os 1.000
e 1.100 m de altitude. Um cenário verdadeiramente espectacular!
Lago Enol, Covadonga.
Algumas fotografias depois e uma paragem no Mirador
de La Reina para mais uma vista panorâmica, era preciso voltar tudo para
trás até Soto de Cangas para retomar a estrada AS-114, seguindo agora para Este
em direcção à zona de Cabrales, conhecida pelo seu afamado queijo de tipo azul,
o Queso Cabrales. O dia terminou no
parque do Hotel
La Casa de Juansabeli, a cerca de 2 km da localidade de Arenas de Cabrales.
Hotel La Casa de
Juansabeli, Arenas de Cabrales.
O check-in foi mais uma vez
efectuado sem problemas (reserva), num local onde impera a qualidade do
atendimento e a simpatia dos proprietários, como pude testemunhar na primeira
pessoa quando, no decorrer do jantar e enquanto saboreava um gostoso “Rodaballo
a la Espalda con Verduras Salteadas”, fui convidado a guardar a moto na garagem
da uma outra habitação junto ao hotel, para a proteger da chuva que entretanto
começava a cair, uma vez que o parque privado do hotel não é coberto. São
pequenos gestos como este que, para mim, fazem toda a diferença. E não ficou
por aqui...
Continua...
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