A Estrada Nacional 222
(abreviadamente designada por EN222 ou simplesmente N222) é mais uma estrada
que atravessa transversalmente o norte de Portugal continental, situada um
pouco mais a sul relativamente à EN103.
Com cerca de 225 km de extensão, a EN222 acompanha quase todo o percurso do rio
Douro em território nacional. O seu trajecto tem início junto à costa, em Vila
Nova de Gaia, terminando já perto da linha de fronteira com Espanha, em
Almendra (Vila Nova de Foz Côa).
Classificada como estrada nacional de 2.ª classe através do Decreto-Lei 34:593 de 11
de Maio de 1945, com a designação “Vila Nova de Gaia – Vila Nova de Fozcoa (proximidades)”, os pontos extremos e
intermédios da EN222 foram definidos em “Vila Nova de Gaia – Avintes – Canedo – Sobrado de Paiva – Sinfãis –
Resende – Penajóia – Régua (margem esquerda) – S. João da Pesqueira – Portela
do Marco (proximidades de Vila Nova de Fozcoa)”.
Localizada
numa das mais belas regiões do país, o percurso da EN222 não deixa ninguém
indiferente. Das paisagens panorâmicas da Região
Demarcada do Douro às agrestes montanhas do nordeste de Portugal e do Parque Arqueológico do Vale do Côa, a rota EN222 convida a desfrutar destes
magníficos locais, ambos classificados como Património
Mundial da UNESCO.
A EN222 começa então em Vila Nova de Gaia, cidade
centro da indústria do afamado Vinho do Porto, repleta de caves abertas a
visitas e provas. O marco
que assinala o km 0 encontra-se no centro do município,
junto a uma das principais estações de metro, nas imediações da Rotunda de
Santo Ovídio (41°07'12.2"N 8°36'17.3"W). E foi naturalmente deste
local que teve início esta minha viagem, realizada no passado dia 21 de Maio sob
condições climatéricas algo instáveis.
Durante a
primeira dezena de quilómetros, a EN222 parece perder-se no espaço urbano
através de uma zona essencialmente plana e com algum trânsito, onde a estrada
assume uma configuração mais rectilínea que, na minha opinião, é pouco interessante.
A coisa começa a animar com a passagem por Olival, onde
as curvas se vão sucedendo por entre as pequenas localidades da região de
fronteira entre o distrito do Porto e o distrito de Aveiro, à medida que progressivamente
nos vamos aproximando do rio Douro pela sua margem sul.
Sensivelmente
ao km 27,4 situa-se o Miradouro de Lavercos ou Miradouro de Lomba (41°02'01.7"N
8°25'30.6"W) e com ele veio a primeira oportunidade para “mirar o Douro” e
desfrutar das magníficas paisagens junto ao rio. Foi pena que o céu se tenha
mantido teimosamente encoberto, sem deixar que o sol tenha sequer dado um ar da
sua graça para, pelo menos, ajudar nas fotografias.
Em pleno distrito
de Aveiro e antes de chegar a Castelo de Paiva, ao km 31 a EN222 parece
transformar-se numa noutra estrada. Trata-se de uma variante mais recente, construída
para permitir às populações locais chegarem mais rapidamente ao litoral e à
região do Grande Porto. Para a evitar, junto à Zona Industrial de Lavagueiras (Pedorido)
há que seguir em direcção à Póvoa pela M222 (um dos troços já municipalizados
mas que mantém os marcos da EN222 original).
Um pouco
mais à frente surge o Miradouro de Gemunde (41°02'51.5"N 8°23'52.0"W)
e uma nova paragem para contemplar as margens do Douro com os seus locais verdadeiramente
deslumbrantes. Deste ponto também se pode ver o Complexo
Mineiro do Pejão, local das antigas minas de carvão que laboraram entre 1859
e 1994.
Retomada
a (nova) estrada, há que fazer novo desvio em Pedorido para regressar à
velhinha EN222, virando à esquerda depois do km 36 e seguindo as indicações
para a localidade de Raiva. São
pouco mais de 12 quilómetros de saborosas curvas até Castelo de Paiva, servidas
em ambiente de densa mancha florestal, intercaladas com a passagem pelas pequenas
povoações que fazem parte da antiga freguesia de Raiva (actualmente denominada União
das Freguesias de Raiva, Pedorido e Paraíso) e da freguesia de Santa Maria de
Sardoura.
Em Castelo de Paiva, mais
propriamente na rotunda junto ao Parque das Tílias, vale a pena deixar a EN222
por breves instantes e seguir pela EN224 em direcção ao Miradouro de Catapeixe
(41°03'34.1"N 8°16'17.1"W). Deste local privilegiado avista-se o rio
Paiva a desaguar no Douro e uma curiosa ilha que está localizada entre os dois,
a Ilha do Castelo ou Ilha dos Amores. Pode não ser a mítica ilha descrita por Luís
de Camões n'Os Lusíadas, mas é
certamente um espaço que faz despertar os sentidos, seja para a prática de
desportos náuticos ou simplesmente para o lazer.
De
regresso à rotunda junto ao Parque das Tílias, a EN222 prossegue em direcção à
vila de Cinfães. A travessia do rio Paiva pela Ponte de Caninhas faz a transição
entre o Distrito de Aveiro e o Distrito de Viseu. Quem estiver com tempo, um
pequeno desvio ao km 74,6 permite visitar o Parque de Lazer do Ribeiro de
Sampaio (41°05'03.8"N 8°07'12.5"W), um paraíso natural perto da Barragem
do Carrapatelo, com cascatas, lagoas, moinhos, praia, percurso pedestre e
parque de merendas.
Pouco
depois de passar por Cinfães,
ao Km 82,1 vale de novo a pena deixar a EN222 por breves momentos e seguir pela
CM1021 para espreitar o Miradouro de Teixeirô (41°05'11.2"N
8°05'07.6"W), onde o rio Bestança (considerado um dos mais limpos da
Europa) e o rio Douro se encontram. Numa zona onde o Douro atinge o seu maior
caudal, daqui também é possível avistar Porto Antigo, ponto de paragem no Douro
durante séculos, bem como a Ponte de Mosteirô, que une Porto Antigo a Porto
Manso, do outro lado do rio, e ainda a cénica Ponte de Pala. Sem dúvida uma das
melhores paisagens da região.
Cerca de
4 km mais à frente, depois de atravessar o rio Bestança, uma visita à Truticultura do Bestança
– Viveiro de Trutas em Cinfães (41°04'40.5"N 8°04'21.8"W) será
uma experiência certamente interessante e diferente. Após a passagem pelo rio
Cabrum, ao Km 95,8 existe um desvio para a Ponte Velha do Cabrum (41°05'29.4"N
8°01'32.1"W), uma das quatro pontes em pedra já existentes sobre este rio
no século XVIII. Trata-se de um dos exemplares melhor conservados a nível
regional de uma ponte medieval, seguindo os modelos construtivos românicos,
podendo situar-se a sua execução em finais do século XIV ou primeiros decénios
do século XV.
Quase a
chegar à centena de quilómetros percorridos, a localidade de Caldas
de Aregos convida a uma pausa bem junto às águas do Douro. Neste tranquilo
e fotogénico local do concelho de Resende, destacam-se as suas Termas, reconhecidas
pelo valor medicinal da sua água natural (captada a 62 ºC) que desde a
Idade Média tem disponibilizado serviços de saúde e bem-estar a todos os que a
ela recorrem. É também aqui que se situa a sede da rota EN222.
Dois
quilómetros após deixar Caldas de Aregos, surge então o marco que assinala o Km
100 da EN222 (41°06'13.7"N 7°59'29.8"W), em Anreade (Resende).
Na região
de Resende, famosa
pela produção local de cereja, o ouro vermelho duriense chega mais cedo e
transforma as suas estradas em bonitas paisagens durante os meses da primavera.
Já com o Festival
da Cereja no horizonte, a venda deste afamado fruto acontecia um pouco por
todo o município. E, claro, foi impossível resistir à tentação e as malas da
Tiger800 lá acabaram por acomodar duas caixas destas carnudas e doces cerejas, compradas
na Casa
da Cereja.
Considerando
que oficialmente a EN222 tem 222,9 quilómetros de extensão (pelo menos é o que
indica a última marcação existente), então não é de estranhar que o seu ponto
médio seja precisamente ao Km 111,45 (41°06'12.4"N 7°54'19.6"W). Este
local foi devidamente assinalado pela ‘rota EN222’ e fica na Rua Padre José Soares
da Silva/EN222, na freguesia de São João de
Fontoura.
Ao passar
pelo km 130 começa a vislumbrar-se a imponente Ponte da Régua sobre o Douro, junto
ao Peso da Régua. Esta
cidade do distrito de Vila Real, situada na margem norte do rio, fica na parte
central da Linha
Ferroviária do Douro, entre o Porto e o Pocinho e é ponto de ancoragem da
rota fluvial de Cruzeiros
que sobem e descem o rio. Por aqui passa também a famosa EN2, a
estrada de maior extensão do país que liga a cidade transmontana de Chaves à
capital algarvia Faro, num total de cerca de 740 km.
Depois de
uma merecida pausa
para repor as energias, a viagem prosseguiu em direcção ao Pinhão. Este pequeno
troço da EN222, com pouco mais de 25 quilómetros, merece uma atenção especial,
já que foi considerado como a melhor estrada
do mundo para conduzir (World's Best Driving
Road) em 2015. Um mix de curvas e
rectas na proporção certa, para disfrutar com tranquilidade das paisagens
e do prazer da condução. As muitas “Quintas”
produtoras de Vinho do Porto aqui localizadas merecem uma visita.
Sensivelmente
a meio do troço, o rio Tedo contorce-se no final do seu curso ao entroncar no
Douro. Está assim criado mais um cenário espectacular da rota pela EN222. E basta percorrer 450 m pela estrada CM1101 para conseguir
belas fotos desta zona da foz do Tedo, mas quanto mais se subir, melhores serão
as vistas.
A chegada
ao Pinhão
faz-se atravessando a emblemática ponte metálica desenhada por Gustave Eiffel
no séc. XIX, após um pequeno desvio de 2 quilómetros pela EN323. Aconchegada
entre o rio Douro, o rio Pinhão e as íngremes encostas resgadas por socalcos, esta
vila tem como principais locais de interesse a marginal ribeirinha, onde fica o
cais de embarque, e a sua Estação
Ferroviária, decorada com painéis de azulejos que retratam paisagens e
actividades tradicionais da região, especialmente o cultivo das vinhas.
Regressando
à rota, a EN222 começa aos poucos a afastar-se do rio Douro em direcção ao
interior da região da Beira
Alta. Porém a paisagem mantém-se grandiosa, à medida que subimos a caminho
do Miradouro de Frei-Estêvão ou Miradouro da Abelheira (41°10'20.6"N 7°29'25.4"W),
sensivelmente ao km 160,25. Uma vista majestosa sobre os socalcos das vinhas, em
pleno vale da zona de Ervedosa do Douro.
A vila de
São João
da Pesqueira, a mais antiga de Portugal, surge pouco depois e com ela o
acesso a um miradouro muito antigo situado acima da Barragem da Valeira chamado
São Salvador do Mundo (41°09'08.5"N 7°21'59.5"W), o maior santuário
do Alto Douro Vinhateiro. Para lá chegar é necessário percorrer cerca de 5
quilómetros pelas estradas EN222-3 e CM1121.
Ao km
184, na antiga freguesia de Pereiros (posteriormente agregada à freguesia de
Vilarouco), deixamos para trás o distrito de Viseu e entramos no distrito da
Guarda, o último atravessado pela EN222. As mudanças na paisagem começam a ser
notórias, com as vinhas a cederem progressivamente lugar às amendoeiras.
Aproximadamente
12 quilómetros mais à frente, na freguesia de Freixo de Numão,
uma placa indica o acesso para a Estação
Arqueológica do Prazo (41°04'07.0"N 7°14'33.3"W). Constituída por
ruínas de uma Villa romana e um povoado
medieval, este importante local apresenta vestígios de uma multiplicidade de
ocupações, que vão desde do neolítico antigo e provavelmente de períodos
anteriores, até à idade média. Quem estiver com tempo não vai dar por mal
empregue a visita.
O marco
que assinala o Km 200 da EN222 já não fica longe. Está localizado um pouco mais
à frente (41°03'05.0"N 7°12'16.4"W), ainda dentro da freguesia de Freixo
de Numão.
Já quase
com Vila Nova de Foz
Côa à vista, a EN222 é interrompida pela passagem do IP2. Assim, na
rotunda de acesso a esta via rápida há que seguir pela EN102 até à entrada na
“capital” das pinturas rupestres, para aí retomar a
EN222. Mas aqui chegado, é uma pena seguir viagem sem dicar algum tempo a
conhecer o importante património do Parque
Arqueológico do Vale do Côa.
Em alternativa
ou como complemento, uma visita ao Museu
do Côa permite disfrutar não só de um edifício de arquitectura singular,
assente com parte do seu volume como que embutido no topo da colina, mas também
de uma paisagem de cortar a respiração sobre a foz do Côa (um dos poucos rios portugueses que efectuam um percurso na
direcção sul-norte),
celebrando o encontro dos dois patrimónios mundiais da região: a Arte Pré-histórica
do Vale do Côa e a Paisagem Vinhateira do Douro.
A viagem
pela EN222 estava a chegar ao fim, terminando o seu percurso perto de Almendra,
onde entronca com a EN332. É aqui que se encontra a última marcação que
corresponde ao Km 222,9 (41°00'08.6"N 7°02'22.6"W), acompanhada por
uma simbólica placa colocada pelo Moto Clube do Côa.
Um
parêntese para referir o desaparecimento da placa que indica o Km 222 (41°00'36.8"N
7°02'19.4"W), provavelmente levada como recordação por algum “amigo do
alheio”...
Daqui até
à Capela
de Nosso Senhor dos Passos, no centro da pequena vila de Almendra são apenas 1.500
metros. É neste local que, alegadamente, termina verdadeiramente a EN222, que
corresponde sensivelmente ao Km 224,4 (40°59'59.4"N 7°03'16.5"W). No
entanto, a marcação existente neste pequeno troço não é referente à EN222 mas
sim à EN332, estrada esta que tem início na antiga Estação
Ferroviária de Almendra, seguindo depois junto à fronteira em direcção a
sul.
Em jeito
de resumo, pode dividir-se o roteiro pela EN222 em três partes principais: Vila
Nova de Gaia/Peso da Régua, Peso da Régua/Pinhão e Pinhão/Almendra. Se na
primeira o destaque são os miradouros com fotogénicas vistas dobre o rio Douro,
na segunda a vertente turística ganha maior peso juntamente com as paisagens
deslumbrantes do Douro Vinhateiro. Já na terceira predominam os tons mais áridos
e as amendoeiras através das montanhas do nordeste de
Portugal.
Ao longo
deste percurso junto ao rio Douro pelos distritos do Porto, Aveiro, Viseu e
Guarda, as opções gastronómicas são muitas e variadas, juntamente com uma vasta
oferta de alojamento de qualidade, fazendo desta road trip pela Estrada Nacional 222 uma experiência única e que,
realmente, não deixa ninguém indiferente.
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