quinta-feira, 6 de agosto de 2020

Na “Pérola do Atlântico” #5/8

Dia 5 (14 de Setembro) – Noroeste da ilha

O quinto dia da viagem à Madeira foi destinado à zona noroeste da ilha, começando com uma visita ao interior da terra através das Grutas de São Vicente, passando por um banho de mar nas Piscinas Naturais do Cachalote no Porto Moniz e regressando à capital novamente pela Floresta Laurissilva e pelo planalto do Paúl da Serra, desta vez pela sinuosa ER209, com interrupção a meio para uma nova passagem por Serra de Água... e para uma segunda paragem estratégica! ;)

Funchal – São Vicente – Cascata do Véu da Noiva (ER101) – Seixal – Porto Moniz – Ribeira da Janela – Paúl da Serra – Serra de Água – Funchal.

Depois de tomado o pequeno-almoço e ainda antes de arrancar para a estrada, foi necessário ir ao centro do Funchal para fazer umas compras. Com cada vez mais coisas para levar na bagagem (a viagem de regresso prometia...), cruzei-me com uma Bordadeira numa das ruas da cidade e fiquei impressionado pela forma minuciosa e perfeccionista como executava a sua arte artesanal, sentada à entrada da loja de um dos principais fabricantes e exportadores do famoso Bordado da Madeira. Que trabalho!

Bordadeira a executar os pontos do famoso Bordado da Madeira, Funchal

Os pouco mais de 30 km que separam o Funchal das Grutas de São Vicente, a primeira paragem do dia, decorreram sem grande história, a rolar tranquilamente ao longo da Via Rápida 1 até à Ribeira Brava, apanhando depois a Via Expresso 4 que passa pelo longo Túnel da Encumeada, um dos maiores do país, com 3,1 km de comprimento.

Não há dúvida que a construção destas infraestruturas rodoviárias veio trazer uma maior valia para as deslocações dentro da ilha. A título de exemplo refira-se que, antes da execução da via rápida e das vias expresso, para se fazer a deslocação entre Funchal e Porto Moniz seriam necessárias 3 horas. Após a construção destas vias, apenas são necessários cerca de 45 minutos.

O acesso às Grutas e Centro do Vulcanismo de São Vicente faz-se através de uma ponte pedonal sobre a Ribeira de São Vicente, localizada no lado oposto à zona de estacionamento (em relação à VE4) ao qual se chega pela Estrada João Abel de Freitas. As visitas são realizadas de Segunda a Domingo, das 10:00 às 18:00. Têm a duração de cerca de 30 minutos e são conduzidas por guias especializadas. O seu preço é de 8,00 €.

Inauguradas a 1 de Outubro de 1996, são as primeiras grutas de génese vulcânica abertas ao público em Portugal. Formaram-se a partir de uma erupção vulcânica há 890 mil anos atrás, ocorrida no Paúl da Serra, que depois foi descendo até ao mar. A parte exterior ficou exposta a temperaturas mais baixas e solidificou rapidamente, enquanto que por dentro a lava continuava a correr com muitos gases, formando assim uma série de tubos de lava, que constituem as grutas de São Vicente, onde é possível caminhar sobre eles. Este conjunto de oito “túneis vulcânicos” apresenta um desenvolvimento total de mais de 1.000 m de comprimento, cuja altura máxima varia ente 5 a 6 m, e é o maior que se conhece, até agora, na Ilha da Madeira.

Acesso às Grutas e Centro do Vulcanismo de São Vicente.

Grutas de São Vicente.

Continuando a estrada e um pouco mais a baixo, na foz da Ribeira de São Vicente, situa-se a curiosa Capelinha de São Vicente. Foi construída num solitário bloco basáltico, no terceiro quartel do séc. XVII (por volta de 1694), e posteriormente restaurada em 1885. Sendo um dos principais ex-libris da vila, esta pequena capela foi construída graças aos donativos dos devotos e por iniciativa de Inácio de Sousa. Segundo a lenda, o santuário foi erigido no lugar onde apareceu o mártir São Vicente que é também o padroeiro da igreja paroquial.

Capelinha de São Vicente.

Ainda em São Vicente, chegava aquela altura do dia em que era necessário fazer uma pausa para “forrar o estômago”. Entrei numa pastelaria/padaria que me despertou a atenção pelo bom aspecto dos seus produtos e pelo reconfortante aroma a pão, bolos e café. Como também servia pequenas refeições tipo snack-bar, optei por num Prego em Bolo do Caco acompanhado por uma Brisa Maracujá, servido numa esplanada na marginal mesmo em frente ao mar e à praia de calhau. Valeu!

Seguindo a ER101/VE2 em direcção a noroeste, sempre junto ao Atlântico, logo à saída do Túnel de João Delgado surgem as indicações para o Miradouro do Véu da Noiva. Situado no antigo traçado da ER101, este miradouro mostra-nos uma das mais emblemáticas paisagens da Madeira. A partir deste ponto podemos ver a Cascata do Véu da Noiva que, devido à sua altura e à carga de água que jorra pela encosta abaixo, faz lembrar precisamente o véu de uma noiva. Junto à cascata pode observar-se o que resta do antigo Túnel do Véu da Noiva, que colapsou em 2008 devido ao recuo da arriba subjacente pela acção erosiva do mar, envolvendo a parte da ER101 onde se situava o túnel e formando uma pequena fajã na sua base.

Cascata do Véu da Noiva, Seixal.

Logo ali ao lado fica o Seixal, a maior freguesia do município do Porto Moniz em termos de área. Um dos muitos encantos desta povoação é a sua pacatez, aliada à beleza de uma paisagem pintada pelo verde da montanha e pelo azul cristalino do mar. Tal como a cidade do Seixal no continente, a origem do seu nome surgiu devido à abundância de seixos existentes nas praias. E falando de praias, é difícil resistir a um mergulho nas piscinas naturais vulcânicas junto ao Cais (Poças das Lesmas e Piscina Natural do Clube Naval), de onde se pode apreciar as belas vistas do mar e da montanha, típico da costa norte da Madeira.

Cais e Piscinas Naturais, Seixal.

Mas não foram estas piscinas naturais que me levaram a “provar” a água da Madeira. Isso seria feito 10 km mais à frente, na vila do Porto Moniz (na ponta noroeste da ilha), depois de uma subida ao Miradouro da Santa pelas apertadas curvas em zig-zag que a ER101 apresenta neste local. Deste miradouro temos uma vista privilegiada sobre a vila, sendo possível observar as piscinas naturais vistas de cima e o Ilhéu Mole.

Miradouro da Santa, Porto Moniz.

O Porto Moniz é um destino turístico bastante popular da Madeira. As principais atracções desta vila são sem dúvida as piscinas naturais, as mais belas de toda a ilha, formadas pela lava vulcânica e que são enchidas pela maré com águas cristalinas. Não só pelas excelentes condições de banho que oferecem, mas também pela sua extrema beleza, estas piscinas são ideais para relaxar, nadar, apanhar sol ou apenas para uma visita.

Vila do Porto Moniz.

À entrada da vila, junto ao Aquário do Forte São João Baptista, ficam as Piscinas Naturais do Cachalote. Ao contrário das Piscinas Naturais do Porto Moniz, estas belas piscinas de origem vulcânica são de acesso gratuito mas não têm vigilância salva-vidas, infraestruturas de apoio nem instalações sanitárias, dispondo no entanto de duche exterior. Considerações à parte, foi neste local bem mais tranquilo que acabei por “ir a banhos” e dei por muito bem empregue o tempo aqui passado.

Piscinas Naturais do Cachalote, Porto Moniz.

A Madeira nunca foi grandemente influenciada pela actividade baleeira desenvolvida por outros países, contrariamente aos Açores que nos séculos XVIII e XIX foram visitados regularmente por navios baleeiros norte-americanos à procura de cachalotes e aí recrutavam tripulantes para as suas caçadas em alto mar. Foi essencialmente a partir da década de 1930 que começaram a ser criados os alicerces para a caça à baleia na Ilha da Madeira.

As primeiras vigias seriam estabelecidas em 1940, uma no Porto Moniz e outra em Machico, em pontos altos na costa com boa cobertura do mar para maximizar a localização das baleias. Confirmada a presença de cachalotes (a espécie de baleia de interesse para a actividade) ao largo do Porto Moniz, as baleeiras e respectivas tripulações, que entretanto tinham sido enviadas dos Açores para operar na Madeira, partiam em perseguição destes grandes cetáceos com arpões e lanças, utilizando pequenos botes em madeira, propulsionados à vela e a remos.

A operação baleeira na Madeira terminou no início da década de 1980, mas ainda hoje podem ser observadas algumas das vigias que foram utilizadas na detecção das baleias. E é precisamente das Piscinas Naturais do Cachalote que, através de um tubo estrategicamente colocado, podemos descobrir antigas vigias da caça à baleia.

Antiga vigia da caça à baleia, Porto Moniz.

Mas estava na altura de iniciar a viagem de regresso ao Funchal. A via escolhida foi a sinuosa ER209, a estrada regional complementar que vai desde a Ribeira da Janela até ao Paúl da Serra pela costa norte, atravessando uma enorme mancha verde de Floresta Laurissilva, e daqui até Canhas pela costa sul. O piso nem sempre se encontra em perfeitas condições, é verdade, mas vale bem a pena pelos bons momentos de condução e pelas belas paisagens que proporciona.

Na ER209 por entre a densa Floresta Laurissilva.

Chegado ao Paúl da Serra, no cruzamento com a ER110, debati-me com um dilema. Porquê seguir já para o Funchal (via Canhas) quando posso fazer um desvio para, agora sim, degustar condignamente a Poncha? Rapidamente a decisão foi tomada. Para a esquerda é que é o caminho. Seguiria então em direcção à Serra de Água para um final de tarde mais animado.

Na Taberna da Poncha, são várias as opções à escolha para se tomar esta típica bebida madeirense. As variantes são a Regional (com laranja ou limão), a Maracujá, a Pescador (com limão) e a Tangerina. A minha preferida é a Regional com laranja, devidamente acompanhada por um copo de amendoins que vão sendo descascados conforme o curioso ritual do estabelecimento... para o chão!

A Taberna da Poncha com as paredes interiores forradas a cartões-de-visita, fotos e outros adereços, Serra de Água.

Algum tempo depois (!?...) e já no Funchal, a noite escura acabou por servir de mote para a escolha do local para jantar. Um saboroso Bife de Atum (acompanhado com batata cozida e legumes) foi servido na pequena esplanada de uma estreita travessa da zona velha, em ambiente tranquilo com atendimento simpático e atencioso. Daqui seguiria para um pequeno passeio a pé pela zona da Marina, aproveitando da melhor maneira as boas condições climatéricas que a Madeira oferece a quem a visita.

Marina do Funchal.

Continua...

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