Dia 6 (15
de Setembro) – Leste da ilha
Para o
último dia de passeio de moto pela Madeira ficou a exploração da zona leste da
ilha, que tem na Ponta de São Lourenço o seu ponto mais oriental, não sem antes
visitar um dos ex-libris madeirenses,
as Casas Típicas de Colmo de Santana, entre outros interessantes e curiosos
locais. Importava também concluir o roteiro da cana-de-açúcar e dos seus
derivados nas instalações dos Engenhos do Norte na povoação do Porto da Cruz,
uma herança de outros tempos onde a Madeira chegou a ser a mais afamada
produtora de açúcar do mundo durante os séc. XV e XVI, conhecido na época como
“Ouro Branco”.
Funchal – Camacha – Parque
Natural do Ribeiro Frio – Santana – Faial – Porto da Cruz – Ponta de São
Lourenço – Machico – Ponta do Carajau – Funchal.
Num
domingo cheio de sol e com temperatura elevada, deixei o Funchal em direcção à Camacha, novamente a subir,
pois claro, pela pitoresca ER102. Esta pequena vila do concelho de Santa Cruz
situa-se a cerca de 700 m de altitude e é o centro da Indústria de Vime
Madeirense. Com as hastes de vimeiro
descascadas e secas, aqui fabricam-se móveis, chapéus, ornamentos, utensílios
de cozinha, e claro, cestos de todos os tamanhos e feitios, que fazem as
delícias dos turistas.
A Camacha
é igualmente famosa pela sua Festa da Maçã e pelos seus grupos de folclore, daí
ser considerada por muitos como a Capital da Cultura Madeirense. Foi também
aqui, no Largo
da Achada, perto da Capela de São José, que se jogou futebol pela primeira
vez em Portugal, no longínquo ano de 1875! O desporto foi introduzido por Henry
Hinton, um jovem britânico que estudava em Londres mas que residia na Ilha da
Madeira.
Continuando
nas sinuosas e agradáveis estradas regionais pelo interior da ilha, o passeio
prosseguiu a caminho do Parque
Natural do Ribeiro Frio, no concelho de Santana, pela ER203 e ER103. Novamente
rodeado por uma vasta mancha da magnífica Floresta Laurissilva, a paragem seguinte
foi no Posto
Aquícola do Ribeiro Frio, local onde se encontram os viveiros de trutas
arco-íris (Oncorhynchus mykiss). Concluídos em 1960, aqui são mantidos
reprodutores para produção de ovos e alevins (peixes jovens) que depois são utilizados,
quando necessário, para o repovoamento das linhas de água da Madeira, estimulando
assim a pesca lúdica em águas interiores.
A ER103 é
certamente uma das estradas mais espectaculares da Ilha da Madeira. Do Parque
Natural do Ribeiro Frio até à povoação costeira do Faial, onde termina o seu
trajecto, são cerca de 13 km de puro prazer, tanto no asfalto como na
panorâmica. Locais como o Miradouro do Cabouco
e o Miradouro das
Cruzinhas, oferecem uma paisagem fantástica sobre vales verdejantes e
profundos, bem como sobre alguns dos picos mais elevados da cordilheira
montanhosa central. Mas até chegar a Santana e já na VR1 (antiga estrada
regional), ainda passaria pelo Miradouro
de Nossa Senhora dos Bons Caminhos e pelo Miradouro do Curtado,
agora com vista privilegiada sobre a recortada costa da freguesia do Faial e o rochedo
da Penha d’Águia.
A povoação
de Santana, cujo
nome se deve a Santa Ana, sua patrona e em honra da qual foi edificada uma
igreja em 1689, foi elevada à categoria de cidade a 1 de Janeiro de 2001, sendo
por isso considerada a primeira cidade portuguesa do séc. XXI. A preservação de
algumas Casas
Típicas de Colmo (habitações de formato triangular cuja cobertura é feita
com o caule da planta do trigo e onde noutros tempos viviam as suas gentes) acabou
por resultar num cartaz turístico por excelência, fazendo com que o município
de Santana seja uma das zonas mais conhecidas e emblemáticas da Ilha da Madeira.
Enquadrado
pela grande quantidade de arbustos de hortênsias, com
predominância para as azuis que aqui se destacam entre a abundante flora, bastou
atravessar a rua para acabar sentado num pequeno snack-bar
a comer um gostoso Hamburger em Bolo do Caco, acompanhado pela já habitual
Brisa Maracujá, a minha bebida madeirense de eleição às refeições. Não
deslumbrou, é certo, mas serviu o propósito.
A caminho
do Porto da Cruz pela VE1, o longo Túnel do Faial Cortado (com 3.168 m de
comprimento) leva-nos até à freguesia do Faial. Terá sido neste
território, a par com a freguesia do Porto da Cruz, onde se procedeu
primeiramente ao povoamento no norte da ilha. Junto ao Complexo Balnear da Foz
da Ribeira do Faial, podem ser observadas umas interessantes formações
rochosas de colunas de basalto que se erguem junto ao mar. Um importante
registo da história geológica e do passado vulcânico da Madeira.
Um pouco
mais à frente, ainda na VE1, o Túnel da Cruz desemboca nos acessos à vila do Porto da Cruz. Pela ER108
acedemos à Praia da Alagoa e aos Engenhos
do Norte, os únicos da Europa que ainda trabalham a vapor, com caldeiras do
início do séc. XX. Neste Engenho só se fabrica Rum Agrícola, o que significa
que é feito a partir de sumo fresco da cana-de-açúcar, depois de fermentado e
destilado. O Rum Agrícola North é a joia da coroa do Engenho. Estes runs têm
recebido vários prémios, sendo os brancos os mais medalhados (runs novos com 40%,
50% e 60% vol.). Existe ainda um salão de vendas com a traça histórica de uma
mercearia antiga.
A saída do
Porto da Cruz fez-se novamente pela sinuosa ER108, retomando a VE1 mais à
frente em direcção ao município de Machico. Uns quantos túneis depois (Serrado,
Guarda, Norte, Cales, Rib. Grande e Quinta) e ainda antes de descer até à zona
da Baía de Machico, a VR1 deixou-me na freguesia do Caniçal, passando por uma
nova série de pequenos túneis (Fazenda, Duplo Caniçal, Portais e Palmeira). Daqui
até à Ponta
de São Lourenço, a árida península que constitui o extremo oriental da Ilha
da Madeira, são apenas 4,5 km pela ER109 que, desafortunadamente, acabariam por
se revelar num verdadeiro martírio para percorrer.
Pouco
tempo depois percebi o porquê deste pequeno trajecto estar completamente
congestionado de carros e de pessoas, originando um enorme engarrafamento. Estava
a decorrer a Festa
da Nossa Senhora da Piedade! Esta festa é celebrada em honra da padroeira
dos pescadores, os quais participam com os seus barcos decorados e pintados com
cores vivas numa procissão aquática até à pequena Capela de Nossa Senhora da
Piedade, no topo do Monte Gordo, perto da Ponta de São Lourenço. No sábado os
peregrinos vão buscar a imagem à capela e esta pernoita na Igreja Matriz do
Caniçal. No dia seguinte, domingo, e após a Missa, os peregrinos deslocam-se
pelo mar para repor a imagem na capela, terminando assim esta festa única.
E por
falar em embarcações, a ER109 levou-me de volta à cidade do Machico, local onde desembarcaram
João Gonçalves Zarco e Tristão Vaz Teixeira quando descobriram a Ilha da
Madeira, em 1419. Já lá vão seis séculos! Sendo esta uma zona de grande
turismo, bem perto do Aeroporto
Internacional, o destaque vai naturalmente para as praias, em especial para
a Praia
da Banda D´Além, localizada na margem direita da foz da Ribeira de Machico.
Esta praia de areia amarela é uma das poucas referências do género na Ilha da
Madeira e está enquadrada na agradável envolvência da Baía de Machico.
Depois de
refrescar a garganta, o passeio prosseguiu junto à costa pela VR1, com curiosa
passagem por baixo da pista do Aeroporto, até à Ponta do Garajau.
Neste promontório situado na freguesia do Caniço, concelho de Santa Cruz,
localiza-se o Cristo
Rei do Garajau que consiste na imagem de Cristo de braços abertos, virado
para o mar. A estátua foi construída em 1927 e é uma obra do escultor francês
Georges Serraz.
Por aqui
existiu um posto de vigia destinado a localizar baleias e cachalotes para
baleação e na sua base, no sítio designado por Calhau do Garajau funcionou uma
estação baleeira, com traiois
destinados a aproveitar a gordura dos animais que eram caçados e rebocados para
o local. Actualmente temos um Miradouro que é um dos mais interessantes pontos
turísticos da ilha e um excelente local para observar aves marinhas. A Ponta
está também ligada à Praia
do Garajau, situada numa pequena fajã existente na sua base leste, com
acesso pedonal através de uma íngreme e sinuosa estrada ou pelo Teleférico do
Garajau.
Com o sol
gradualmente a desaparecer no horizonte era tempo de regressar ao Funchal,
cumprindo os últimos 8 km do dia na VR1 e nas estradas de acesso ao local do
alojamento, perto da Fortaleza de São Tiago, na zona velha.
Já com a
lua em lugar de destaque no céu nocturno e uma temperatura ambiente magnífica que
convidava a desfrutar da noite ao ar livre, a despedida gastronómica em solo
madeirense decorreu numa pequena esplanada
em ambiente de tasca literária, no local onde foi pintada a primeira porta do movimento
artístico artE de pORtas abErtas.
Depois de
umas suculentas Vieiras com Bacon e alho, foi um saboroso Filete de Espada com
azeite e camarão, acompanhado por legumes cozidos e pela já habitual Brisa
Maracujá, que fechou com chave de ouro a minha experiência culinária na
Madeira. Fechado ficava também este 6.º dia da viagem de moto à “Pérola do
Atlântico”.
Continua...
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