Dia 3: Marrocos
(Meknès – Agoudal)
Um amanhecer cinzento e húmido parecia confirmar as previsões de chuva para
este 3.º dia do Marroco Xperience Tour 2022, que marcou o início de um outro
Marrocos, mais profundo e genuíno. Começava o contacto com as montanhas e suas
gentes, assim como com as aldeias berberes do Medio Atlas. O ponto alto do dia,
literalmente, seria a chegada à localidade de Agoudal, situada a mais de 2.000
metros de altitude em pleno Alto Atlas.
Com o pequeno-almoço tomado no hotel, fizemo-nos à estrada novamente à
“hora que ninguém desconfia”, ou seja, por volta das 08:30. Desta vez o fato de
chuva fez parte da indumentária, opção esta que mais tarde viria a revelar-se
providencial.
Sempre com a ameaça da chuva a pairar no ar, a primeira paragem do dia
foi na cidade de Azrou, nas
montanhas do Médio Atlas, onde tomámos um chá de menta num café junto ao hotel Fath
Annour e visitámos a floresta
dos cedros e macacos selvagens (macaco-de-gibraltar, também conhecido por
macaco-berbere). Estes curiosos e irrequietos primatas, habituados a pedir e
roubar comida aos turistas, são uma das grandes atracções desta área.
Um pouco mais a sudoeste fica a localidade de Khénifra, capital histórica
dos Berberes Zayanes. Ocupa um planalto que é atravessado pelo Rio Morbeia (Oum
Errabiâ), que passa pela cidade, rodeada por quatro montanhas com mais de 2.000
metros de altura e que a isolam das regiões vizinhas. Foi com esta paisagem em
fundo que nos sentámos à mesa para o almoço, no Restaurant
Rania, para saborear as tagines e
o frango assado da casa, acompanhados pelo habitual pão tradicional. Tudo
bastante bom.
Foi depois já a caminho do majestoso Alto Atlas que o céu finalmente
“desabou” sobre as nossas cabeças. E é quando as condições se tornam mais
difíceis que a fragilidade, ou a menor confiança, de alguns acaba muitas vezes por
se revelar. Foi o que aconteceu com um dos elementos do grupo, onde num gancho
mais apertado e com o piso escorregadio acabou por cair. Felizmente que, para
além do orgulho ferido, não houve consequências para o condutor e respectiva
pendura.
O cenário não era o mais animador para uma viagem de moto por Marrocos,
de facto, e passadas algumas horas de condução à chuva, parte da caravana
mostrava-se um pouco apreensiva. Mas há que saber “dar a volta” à situação, até
porque num país onde existem regiões e climas tão diferentes como montanhas,
deserto e praias, este tipo de constrangimentos podem facilmente acontecer. Faz
parte da aventura.
Os quilómetros foram passando e as condições mantinham-se pouco
agradáveis. Já bastante molhados e desconfortáveis, efectuámos uma paragem para
desanuviar e tomar uma bebida quente num café
à entrada da aldeia de Aghbala,
uma comuna rural situada a cerca de 1.700 metros de altitude.
A viagem prosseguiu com cautela devido ao piso escorregadio e traiçoeiro
que as estradas apresentavam. Já perto da vila e comuna rural de Imilchil, fomos uma vez mais
surpreendidos por um grande ajuntamento de pessoas, numerosas tendas e veículos
junto à estrada. Estava a ser desmantelado o moussem
(festival dos noivados), que se realiza anualmente e durante três dias no final
de Setembro. A data precisa depende da altura das colheitas, antes das
primeiras neves deixarem muitas aldeias praticamente isoladas.
O moussem de Imilchil (Souk Aam ou Agdoud
N'Oulmghenni ou Souk Aamor Agdoud N'Oulmghenni) é uma manifestação cultural de grande
importância para a generalidade dos berberes de Marrocos, onde se misturam a
mística e a arte, e onde não falta a música, dança, festas e roupa colorida. É o
evento onde tradicionalmente os berberes de toda a região e arredores escolhem
os futuros cônjuges e celebram os noivados no santuário de Sidi Ahmed El Mgheni
(Sidi Ahmed Oulmghenni).
Pouco tempo depois avistávamos o Lac Tislit e o Lac Isli, dois lagos em
altitude (acima dos 2.200 metros) no Alto Atlas onde as tribos berberes Aït
Haddidou conduzem os seus rebanhos no verão. Acabámos por não parar, até porque
o desconforto e a reduzida visibilidade nos impediam de apreciar a beleza deste
local.
Seguimos então diretamente para o final etapa, na localidade de Agoudal, uma das aldeias de maior
altitude em Marrocos, a mais de 2.300 metros acima do nível do mar. Localizada na
cadeia montanhosa do Alto Atlas, Agoudal fica na junção das Gargantas do Dadès
e do Todgha. O alojamento estava reservado para o Auberge
Ibrahim, um conhecido local de pernoita de numerosos viajantes e expedições
a Marrocos, que nos recebeu de forma calorosa.
Depois de um merecido banho quente e com o equipamento da viagem a secar
dentro do castiço quarto revestido a adobe, seguiu-se o jantar num
ambiente familiar de convívio entre os presentes, que incluiu os restantes
hospedes que aqui se encontravam alojados. A sensação que tive foi de estar num
lugar especial, quase uma comunidade, gerido por uma equipa com genuína hospitalidade
e calor humano.
As tagines e o pão marroquino
foram as principais iguarias à mesa, servidas em ambiente tranquilo e de boa
disposição. E nem mesmo uma ligação Wi-Fi de muito fraca qualidade impediu a alegria e
o divertimento de todos, especialmente depois da grande
animação que estava reservada para o final. Uma sessão improvisada de música
tradicional berbere, acompanhada com instrumentos de precursão, surpreendeu o
grupo pela sua proximidade e informalidade, terminando tudo numa grande festa. Muito
bom!
Continua...
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