Dia 3 (12
de Setembro) – Cidade do Funchal
A Cidade
do Funchal é a capital da Ilha da Madeira. A sua designação deve-se aos
primeiros povoadores que, ao desembarcar neste lugar, se depararam com a grande
quantidade de funcho,
uma erva bravia com cheiro adocicado que existia em abundância no vale, na área
do primitivo burgo. Aqui concentra-se mais de um terço da população da ilha,
sendo a cidade mais populosa fora do território continental português.
Situada na
costa sul da ilha, numa baía banhada pelo Oceano Atlântico, Funchal constitui o
maior centro turístico, comercial e cultural de todo o Arquipélago da Madeira, motivo
mais que suficiente para dedicar um dia à sua descoberta, deixando desta vez a
Tiger 800 a descansar.
Assim, a
manhã começou com uma subida de teleférico
em direcção ao Monte,
numa viagem de pouco mais de 10 minutos que liga o Jardim do Almirante Reis (junto
à Zona Velha) ao Largo das Babosas (Monte), proporcionando excelentes vistas
sobre a baía e os vales do Funchal.
Aqui
chegado, o destaque vai para a magnífica vista panorâmica sobre a cidade e o
mar que os 550 m de altitude proporcionam. O acidentado relevo e a acção dos
ventos geram microclimas que favorecem o crescimento de frutas e plantas
ornamentais variadas, razão pela qual a Madeira é também apelidada de “Ilha das
Flores”.
Para além
do Jardim
Botânico (cujo acesso pode ser efectuado através de um outro teleférico situado
perto deste local), um dos melhores espaços para se apreciar esta vegetação
luxuriante e exótica é sem dúvida o fantástico Jardim Tropical Monte Palace, integrado
na Quinta Monte Palace, propriedade da Fundação José Berardo.
A
Freguesia do Monte foi criada no ano de 1565 com base na devoção à N. Sr.ª do
Monte, que remonta ao séc. XV. Com a aluvião
de 1803, a Senhora do Monte passou a ser evocada como padroeira da Ilha da
Madeira e, em 1818, foi inaugurada uma igreja
em sua homenagem. Aqui encontra-se o túmulo do Beato Carlos I de Habsburg, o último
Imperador da Áustria e, simultaneamente, o último Rei da Hungria (como Carlos
IV) e o último Rei da Boémia (como Carlos III).
Junto à
igreja fica o Parque
Leite Monteiro (Parque do Monte), um Jardim Municipal que cobre grande
parte desta freguesia, com uma área de 26.000 m2. Este amplo espaço
verde possui várias espécies indígenas e exóticas, bem como algumas árvores
centenárias, convidando os visitantes a um tranquilo passeio.
No centro
do parque situa-se o Largo
da Fonte, local de má memória pela tragédia
ocorrida em 2017, com a queda de uma árvore de grande porte durante as
festividades de N. Sr.ª do Monte. No meio do largo destaca-se o Coreto e na
periferia o bonito edifício do Café Parque, bem como o Fontenário de N. Sr.ª do
Monte com um pequeno nicho com a imagem de N. Sr.ª da Conceição (conjunto
inicial do séc. XVI, com obras em 1777, foi destruído pela queda de um
castanheiro em 1896, tendo sido então construído o actual).
No lado
oposto, o Largo da Fonte é marginado pela estrada do Caminho de Ferro
do Monte, por onde transitava o Comboio do Monte (ou Elevador do Monte como
também era conhecido) desde o final do séc. XIX. Esta ferrovia de via única em
cremalheira ligava o Pombal,
no Funchal, ao Terreiro
da Luta, no Monte, numa extensão 3.911 m. A ocorrência de dois acidentes
fez com que a população deixasse de usar este transporte, levando a que a linha
fosse desmantelada em 1943. A Estação da Fonte, da qual ainda existe o edifício
e o pequeno quiosque de venda dos bilhetes, era ponto de paragem obrigatória de
quase todos os visitantes do Funchal do início do séc. XX e o passeio favorito
dos habitantes da cidade.
Estação da Fonte do Caminho
de Ferro do Monte: O antes (via)
e o depois (actual).
O final
da manhã estava próximo e era então altura de regressar à cidade do Funchal. E nada
é mais emocionante que descer estas ingremes ruas sentado num dos tradicionais
Carros de Cesto, conduzidos com mestria pelos experientes Carreiros do Monte. O
percurso tem perto de 2 km de comprimento e demora cerca de 7 minutos, com início
junto à Igreja de Nossa Senhora do Monte e o fim
já na Freguesia do Livramento. Durante o trajecto, dois fotógrafos estrategicamente
colocados encarregam-se de captar o momento para mais tarde recordar. Uma
experiência verdadeiramente única!
Depois de
concluída a travessia a pé do resto da Freguesia do Livramento e já na zona
baixa do Funchal, o emblemático Mercado
dos Lavradores foi a paragem seguinte. O mercado foi inaugurado em 1940 e
tem uma área coberta de 9.600 m2, sendo um dos edifícios mais
conhecidos da cidade. Este projecto da autoria de Edmundo Tavares apresenta uma
arquitectura própria do Estado Novo e reflecte a intenção de o tornar no grande
polo abastecedor da cidade. Grandes painéis de azulejos da Faiança Battistini
de Maria de Portugal (Fábrica de Loiça de Sacavém), datados de 1940 e pintados
com temas regionais por João Rodrigues, ornamentam a fachada, a porta principal
e a peixaria.
Com os
sentidos já bastante despertos, estava na altura de fazer pausa para uma
refeição rápida antes de prosseguir com o passeio. A escolha acabou por recair
num suculento hamburger em Bolo do Caco, acompanhado por uma Maracujáda
(limonada de maracujá) natural e artesanal, servido numa esplanada
em frente à casa onde viveu o escritor Júlio Diniz, perto do Jardim Municipal
do Funchal. Aprovado!
Cerca de
2 km a oeste deste local fica a Fábrica
do Ribeiro Sêco. Fundada em 1883, conta com engenho que é um dos mais
antigo da ilha ainda em laboração. A partir da trituração da cana-de-açúcar
(cana sacarina), a fábrica especializou-se na produção de Mel-de-Cana Clássico
e Biológico, um produto 100% natural e de elevada qualidade, sem aditivos,
corantes ou conservantes. Para além do mel propriamente dito, podem comprar-se também Broas
de Mel-de-Cana e o tradicional Bolo de Mel-de-Cana.
De regresso
à zona ribeirinha, com passagem pelo verdejante Parque
de Santa Catarina, a entrada para o centro do município fez-se pelo local outrora
apropriado para o efeito, ou seja, atravessando o Portão
dos Varadouros (Portas da Cidade). Construídas em 1689, no tempo do
governador D. Lourenço de Almeida, as Portas da Cidade integravam a muralha
defensiva do Funchal e davam acesso ao varadouro de barcos na praia do calhau,
na actual Avenida do Mar. Foram demolidas em Maio de 1911, tal como grande
parte das antigas muralhas (já sem utilidade militar para a época), na
sequência da adaptação da baixa da cidade ao automóvel. A sua reposição no
mesmo local teve lugar em 2004, no âmbito das comemorações dos 500 anos do
Funchal.
Perto do Palácio
de São Lourenço (fortaleza do séc. XVI e local da representação da
República na Região Autónoma da Madeira) e junto ao edifício do Banco de
Portugal, mais precisamente na intersecção das Avenidas Zarco e Arriaga, fica a
estátua
alusiva à figura histórica de João Gonçalves Zarco, um dos descobridores da
Madeira e primeiro Capitão do Donatário do Funchal. Executada pelo escultor Francisco
Franco em 1927 (a qual obteve a medalha de ouro na Exposição Ibero-Americana em
Sevilha, em 1929) e com o projecto do pedestal a cargo do arquitecto Cristiano
da Silva, o conjunto foi erguido em 1934.
O
edifício da Sé
Catedral do Funchal fica já aqui ao lado, a cerca de 100 m de distância.
Mas mesmo em frente, a tentação assolou-me os sentidos na forma do Golden Gate Grand Café, um dos mais requintados
da cidade. E não foi fácil resistir aos prazeres da gula, mas lá consegui
seguir, sem fraquezas a registar, rumo ao principal templo religioso do
Arquipélago. Classificado como Monumento Nacional desde 1910, do interior da
Catedral destaca-se o retábulo da capela-mor mandado executar pelo Rei D.
Manuel I em 1510-1515, bem como um dos mais belos tectos de templos religiosos
do país, elaborados com madeira da ilha.
Seguindo
pela Rua João Tavira em direcção a uma das principais zonas do centro histórico,
cerca de 200 m depois fica a Praça
do Município e os seus edifícios circundantes que perfazem um belo conjunto
arquitectónico. Aqui destacam-se os Paços do
Concelho (Câmara Municipal do Funchal, antigo Palácio do Conde Carvalhal – séc.
XVIII), a Igreja
de São João Evangelista (Colégio dos Jesuítas – séc. XVII) e o Museu de
Arte Sacra (onde funcionou o antigo Paço Episcopal – séc. XVI). No centro
da praça existe um Chafariz datado de 1942.
Saindo da
Praça do Município para leste, estamos no caminho certo para conhecer uma das lojas
mais castiças do Funchal, a Fábrica
S.to António. Desde a sua fundação, em 1893, a fábrica e loja
têm permanecido no mesmo local, na Travessa do Forno. Assim que se entra na
loja, a sensação é de que o tempo andou para trás, de volta às mercearias do
antigamente. Entre os vários (e bons) produtos aqui comercializados,
destacam-se o Bolo
de Mel-de-Cana e os Rebuçados
de Funcho (ambos finalistas regionais das 7 Maravilhas – Doces de Portugal),
as Broas
de Gengibre ou os Beijinhos
de Avelã, entre muitos outros. Um espaço cheio de memórias de outras
épocas, de onde dificilmente se sai de mãos a abanar. Mesmo!
Descendo
em direcção ao mar vamos dar à ampla Praça
da Autonomia, local onde as ribeiras de Santa Luzia e de João Gomes se encontram
e seguem em direcção ao Atlântico. Esta importante praça no centro do Funchal
celebra precisamente a autonomia do arquipélago da Madeira. A estátua aí
existente é da autoria de Ricardo Velosa. Foi inaugurada em 1987 na rotunda de
acesso ao aeroporto e transferida para este local em1991.
No topo
Norte da praça podem ver-se as ruínas arqueológicas do Forte de S. Filipe, localizadas
entre as ribeiras de Santa Luzia e de João Gomes. Esta estrutura foi erguida em
1581 como complemento à defesa da baía do Funchal, após a desastrosa ocupação
corsária de 1566.
Já em
plena Avenida do Mar, por entre transeuntes, turistas e os sempre apressados Horários do
Funchal (a empresa local de autocarros de transporte público), o passeio
prosseguiu em direcção à zona velha, desde a Praça do Povo
(construída com o entulho das enxurradas
de 2010) até ao Jardim
do Almirante Reis. Ao longo da zona ajardinada da marginal podem ver-se
diversos monumentos e estátuas associadas às mais variadas evocações, como por
exemplo o Padrão
do Raid Aéreo Lisboa-Funchal de 1921, a Escultura
ao Barqueiro, a Estátua
ao Emigrante Madeirense, a Estátua
ao Empresário Madeirense, o Monumento
ao 58.º Aniversário da Força Aérea, o Monumento
aos 500 anos da Diocese do Funchal, entre outros.
Depois de
um refrescante gelado saboreado a contemplar o mar e de um já merecido descanso
no alojamento, a noite começou com o jantar servido num espaço agradável
com esplanada, curiosamente não muito longe do local onde tinha almoçado. A
escolha recaiu numa entrada de Bolo do Caco com manteiga de alho (um must), seguida da Espetada Regional em
pau de loureiro com milho e batata fritos, acompanhada de salada. Comida bem
confeccionada, com apresentação cuidada e a preços honestos. Gostei!
Com um
bonito cenário de luz e cor, enquadrado pelas águas calmas do mar e o casario na
encosta do Monte, a marginal “by night”
transforma-se e ganha uma outra vida. Estava então de regresso à Praça da
Autonomia, numa atmosfera diferente, para fechar com chave de ouro este dia de
visita à cidade do Funchal.
Continua...
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